quinta-feira, 20 de maio de 2010

O fascismo financeiro

Um dos sinais da crise da democracia é a emergência do fascismo social. Não se trata do regresso ao fascismo do século passado. Não se trata de um regime político, mas antes de um regime social. Em vez de sacrificar a democracia às exigências do capitalismo, promove uma versão empobrecida de democracia que torna desnecessário e mesmo inconveniente o sacrifício. Trata-se, pois, de um fascismo pluralista e, por isso, de uma forma de fascismo que nunca existiu, com cinco formas de sociabilidade fascista, uma das quais é o fascismo financeiro.

O fascismo financeiro é talvez o mais virulento. Comanda os mercados financeiros de valores e de moedas, a especulação financeira global, um conjunto hoje designado por economia de casino. Esta forma de fascismo social é a mais pluralista na medida em que os movimentos financeiros são o produto de decisões de investidores individuais ou institucionais espalhados por todo o mundo e, aliás, sem nada em comum senão o desejo de rentabilizar os seus valores. Por ser o fascismo mais pluralista é também o mais agressivo, porque o seu espaço-tempo é o mais refractário a qualquer intervenção democrática. Significativa, a este respeito, é a resposta do corretor da bolsa de valores quando lhe perguntavam o que era para ele o longo prazo: "Longo prazo para mim são os próximos dez minutos." Este espaço-tempo virtualmente instantâneo e global, combinado com a lógica de lucro especulativa que o sustenta, confere um imenso poder discricionário ao capital financeiro, praticamente incontrolável apesar de suficientemente poderoso para abalar, em segundos, a economia real ou a estabilidade política de qualquer país.

A virulência do fascismo financeiro reside em que ele, sendo de todos o mais internacional, está a servir de modelo a instituições de regulação global crescentemente importantes, apesar de pouco conhecidas do público. Segundo o colunista do New York Times, Thomas Friedman, "o mundo do pós-guerra fria tem duas superpotências: os EUA e a agência Moody's". Se a primeira pode eliminar o inimigo, utilizando arsenal militar, a segunda tem poder para estrangular financeiramente um país, atribuindo-lhe uma má nota".

A virulência do fascismo financeiro reside no seu potencial de destruição, na sua capacidade para lançar no abismo da exclusão países pobres inteiros. Se antes se pensava apenas nos países do chamado Terceiro Mundo, esta verdade recupera-se hoje para os países da União Europeia.

(Retirado de um artigo de Boaventura Sousa Santos)

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